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Living in a house, very big house, in the country ….

Desde os meus 10 anos, quando a família regressou do Brasil, onde fui nascer, que o meu Avô materno, Luiz Filipe, fazia questão de nos levar “à Cancela”, como ele chamava.

“A Cancela”, era e é, a quinta da família em São Lourenço de Sande, uma pequena freguesia do concelho de Guimarães, já encostada a Braga, vinda dos tempos do meu trisavô Manuel, onde a família não vivia, mas onde ia com alguma regularidade.

Íamos ao Sábado, com um farnel de almoço, e “acampávamos” na varanda para almoçar, entre uma manhã e tarde passadas a correr os campos, a inspecionar as intermináveis obras da casa (como o meu avô dizia … “é para se ir fazendo…”)  e a descarregar o velhinho, mas fiável Opel Kapittan, com cómodas e “ferranchada” e a carregar com batatas, cebolas e garrafas de vinho.  

Acontecimento incontornável do ano era quando, chegado o mês de Outubro, se faziam as vindimas! Todos os anos, era a incansável preparação de um ritual, de uma logística, de um processo. 

Foi aí que aprendemos, com a tradição de 4 gerações, como se fazia o Verde Tinto!  Preparar cestos, tratores, tesouras, e íamos para os campos, os trabalhadores com as escadas às costas, para subir às ramadas, onde estavam penduradas as uvas tintas. 

Com o passar do dia, as uvas iam enchendo os 3 lagares da quinta, numa quantidade de vinho já muito considerável, mas com uma qualidade pouco aconselhável … à noite, pisava se no lagar, num processo hoje pitoresco, mas na altura apenas “duro”!

Passados já muitos anos, sentado na referida varanda, o nosso Avô já não ia para o campo, mas acenava positivamente com a cabeça, quando íamos chegando com o trator carregado de uvas ao eido da casa, no seu caminho para o lagar. 

Foi desta forma, com a insistência, ou melhor, com a exigência da presença dos netos, que o nosso Avô, hoje pensamos de forma consciente, nos fez aprender fazendo, e nos fez ganhar gosto por este legado.

Passaram-se mais de 20 anos, e o falecimento do nosso Avô Luiz Filipe, com a bonita idade de 91 anos, levantou o “problema” habitual, do que é que se faz com estas propriedades;

Após partilhas sucessivas das gerações anteriores, chegou-me à mão, não bem uma quinta, mas o que eu carinhosamente chamo um quintal grande.  Uma casa com 300 anos, habitável, mas sem condições de habitabilidade, e uma vinha de Verde Tinto, quando toda a região foi virando para os brancos!…e um hectare de floresta também!!!

…chegados a este ponto temos o título deste texto ☺ !!! … recordam-se? …os que forem mais ou menos da minha idade devem chegar a esta facilmente no “baú” dos anos 90….

Era realmente uma casa grande, muito grande, em mau estado, “lots of good, old charm in the country…” e a mim, nos meus vinte e muitos anos, parecia-me um desafio à altura!!

Tinha a visão de a transformar numa “Guesthouse”, transformar o vinho num produto artesanal de qualidade, juntar os dois, misturar com a vontade de receber e contar histórias… num projeto que parecia poder resultar!! 

Muito antes de o turismo ser moda, e antes do vinho ser “trendy”, eu era “the man with the plan”.   

A família estava um pouco assustada, pois a propriedade, como muitas, era aquilo a que hoje claramente nos referimos como um “money pit”. Dizia a minha Mãe… “tu vê lá … toda a vida o teu Avô enterrou lá dinheiro ….”, ao que eu respondia … “..não há problema, porque eu não tenho dinheiro para lá enterrar !!!”

O projeto era grande, mas eu acreditava que era capaz de o fazer funcionar, e sozinho, lancei me ás obras, ao seu financiamento (sem um cêntimo de “subsídios”), e à visão que tinha.

Num ano, desfiz e refiz a casa completa, num tempo record de 11 meses, ficando as paredes ao alto apenas.

Restaurou-se a casa de 1720, com todos os confortos da vida moderna, com 6 suites e um cottage, a nossa “Casa das Bonecas”, manteve-se o lagar original com 300 anos, onde ainda hoje, “non-stop” se faz Verde Tinto, e fez-se uma experiência de arquitetura moderna, ao instalar a nossa adega e “wine lounge” numa construção de contentores marítimos reciclados (muito antes da moda…), isolada com cortiça natural e improvavelmente apropriada para o espaço. A piscina, um tanque de pedra com água corrente natural de nascente, uma das obras intermináveis do meu avô, é hoje onde nos podemos refrescar no Verão. 

Foi uma prova de fogo de “project management”, aquilo que afinal eu sempre gostara de fazer. Requisitos do projeto, prazo e orçamento foram atingidos dentro do esperado!! … bem, quase … a verdade é que o orçamento deslizou um bocadinho, mas só 6%… não foi mau ☺ !

Depois de em 2014 e 2017 ter replantado e aumentado as nossas vinhas para 2,5 hectares, (ainda muito pequeno numa escala comercial), em 2019, mesmo antes da corrente pandemia estourar, lancei a nossa marca de vinhos e espumantes, tintos e rosés, vinificados apenas a partir de castas tintas, HE-MJ.

Henriqueta e Maria Júlia, eram o nome das minha Bisavó e da minha Avó, e são também os nomes das minhas filhas. 

Perpetuamos em cada garrafa as gerações que nos precederam e fazemos as atuais sentirem como seu este legado. Hoje as minhas filhas e os meus sobrinhos, a geração seguinte, a 6ª, já vindimam e trazem o trator com uvas para o lagar, como outrora fizemos o meu irmão e eu. 

A casa da Quinta da Cancela, hoje não é um hotel… é uma casa de família, e que só faz sentido quando a partilhamos… com a família, com amigos e com os nossos hóspedes… que passam a ser amigos e são de mais de 50 países diferentes! 

O nosso vinho, não é apenas uma garrafa… é um pedacinho das nossas vinhas, da nossa dedicação e tenacidade, que cada um leva consigo, e que nos passou pela mão dezenas de vezes… não foi processado numa fábrica… foi pisado num lagar com 300 anos!

Não é um “9 to 5”… Não é um emprego, nem apenas um negócio… 

É uma forma de vida!

Há maneiras mais fáceis de viver? Há! …mas não é a mesma coisa!!!

Cheers!!!

ACARVALHO

Numa linha, Arthur define-se como: Pai de 3, Serial Entrepreneur, Hotelier, Agricultor, Sailor e Land Rover addict. Tem um fraco por coisas antigas, o seu carro de uso diário é um Land Rover de 1975 e sempre que pode “foge” para o mar. Licenciado em Ciências Económicas e Empresariais, trabalhou em ramos tão diversos como imobiliário e construção, sistemas de informação, import/export, vinhos e turismo, sempre na vertente de “Gestão de Projectos”. Mudou-se diretamente de Paris onde trabalhava em projectos de ERP/CRM numa multinacional Norte-Americana, para São Lourenço de Sande em Guimarães, num regresso às origens de família. Há 14 anos que trabalha exclusivamente na 1720 Quinta da Cancela, onde “é curador de um legado que espera a chegada da próxima geração”.

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